quinta-feira, 8 de maio de 2008

"Enterrem meu coração na curva do rio"...


Vida, vidas, vi vidas, vivi vidas, vinte vidas, vividas...


Às vezes os minutos duram eras,
Éramos diferentes antes de bater o relógio,
Recordas as flores d´outras primaveras?
Não fuja, não se esconda do belo ócio.

Na límpida superfície afloram bolhas
Quebrando o espelho do céu noturno,
A lua baila ao som das folhas
Meu coração palpita taciturno.

Na face curvilínea da esquina
Onde, desvairados, peixes viviam
Enterrou-se, do meu coração, a rima,

Silenciaram os gorjeios das aves de rapina
Que nas minhas cinzas colinas dormiam.
"Existirmos, a que será que se destina?"

domingo, 4 de maio de 2008

Esforcem-se para criar um estado de coisas onde todos sejam humanos...



De que serve a bondade
Se os bons são imediatamente liquidados, ou são liquidados
Aqueles para os quais eles são bons?

De que serve a liberdade
Se os livres têm que viver entre os não-livres?

De que serve a razão
Se somente a desrazão consegue o alimento de que todos necessitam?

2

Em vez de serem apenas bons, esforcem-se
Para criar um estado de coisas que torne possível a bondade
Ou melhor: que a torne supérflua!

Em vez de serem apenas livres, esforcem-se
Para criar um estado de coisas que liberte a todos
E também o amor à liberdade
Torne supérfluo!

Em vez de serem apenas razoáveis, esforcem-se
Para criar um estado de coisas que torne a desrazão de um indivíduo
Um mau negócio.

Bertolt Brecht

Todos igualmente diferentes... Não se padronize... "Seja você mesmo, mas não seja sempre o mesmo" - Ouse... Seja...


“Penso

e espero que jamais alcance

a imprudente idade do bom senso.”
Maiakovski


A Idade do Senso-Comum


Comum, igual para todos, a média da intelectualidade, nem muito, nem tão pouco. Costumeiramente conservador, pautado pelas tradições restritivas de uma sociedade. Senso, ou como é sentido pelos membros da comunidade um determinado assunto. Sentimento mediano de uma população conservadora – Senso-comum. Sentidos amestrados, obedientes às convenções sociais. Mesmo o corredor mais vigoroso desiste perante tantas correntes. A maior parte da sociedade também acaba se entregando depois de séculos sob o jugo do Senso-comum.
Mediocridade é um atributo fundamental para o sistema. Os medíocres contentam-se com pouco, com muito, com a média, com excessos e escassez. Eles simplesmente contentam-se. Na verdade, não importa a quantidade nem a qualidade, obedecem, engolem os grãos secos e ásperos da submissão.

“Penso e espero que jamais alcance a imprudente idade do bom senso”

Porque imprudente? Prudência é encontrar o equilíbrio, saber discernir entre o bom e o ruim, descobrir a harmonia entre o muito e o pouco, sentir a precisão do ideal. Imprudente justamente por perder a autonomia de decidir por si esses parâmetros, relegar a outros, ao senso-comum, também conhecido como bom-senso, esta criação coletiva, este ente metafísico que preenche os espaços vazios entre as almas sociais, as rédeas da própria escolha. A imprudente idade do bom-senso é aquela que acomete os que não mais se importam em lutar pelo que acreditam, buscar novos mundos, levantar utopias, pincelar realidades impossíveis, em distinguir os abusos e absurdos. Aqueles que esqueceram dos próprios pés, mãos, mente, corpo, para juntar-se à massa disforme, conforme, amorfa, intangível, das regras, convenções, paradigmas, verdades absolutas que ninguém mais questiona.
Na construção conjunta da Humanidade verdadeiramente humana, fraterna, justa, igualitária e rica em diversidade, ninguém pode afundar nos poços que afogam suas individualidades, nem deixar calar suas vozes, em detrimento da voz ‘oficial’, ou esquecer seus caminhos pessoais em troca da estrada cimentada, medida e padronizada na qual muitos se esquecem se si mesmos. “Todos os caminhos levam à Ele”, todas as vidas, infinitamente pessoais levam, no fim, ou no princípio, à humanidade. Não é uma questão de isolar-se para manter o indivíduo, é se unir na plena consciência de que cada um é especial, único, arte imprescindível e inigualável no mosaico humano.

“Lutar pela igualdade, sempre que as diferenças nos descriminem; lutar pelas diferenças sempre que a igualdade nos descaracterize” Boaventura de Sousa Santos – Sociólogo

Como salvar a humanidade sem antes salvar um homem? - Segure primeiro essas mãos...


Porque a Solidariedade - II


Severas críticas existem contra o voluntariado. Contra esta luta na sua forma mais simples contra a crueldade e indiferença mais complexa dos homens. Dizem que é paliativo, desencargo de consciência, ou que só aumenta o mal. - Não resolve o problema e ainda o mitiga, tornando mais difícil solvê-lo, já que a crueza se disfarça -, uma alegação muito comum. - Quanto mais brutal a opressão, melhor para combatê-la, pois o extremo da dor comove muitos mais, vence maiores desavenças. - Feridas reconfortadas pelo bálsamo acabam esquecidas, esquecem-se as facas que as abriram, pois novos calmantes estarão disponíveis. – Existe qualquer verdade nisso tudo. Mais existe ainda mais desumanidade, crueldade, brutalidade.

Como ousam, aqueles que se dizem combater os carniceiros de homens, preferirem rios de sangue, justificando ser neles mais fácil navegar, condenando os que, com pequenas pás, tentam afogar as incontáveis nascentes vermelhas, afim de secar, mesmo que só um pouco, os caudalosos rios. Como podem atirar pedras contra os esquilos que semeiam novas sementes, sob o pretexto de que as escavadeiras precisam revolver a terra para nascerem as novas florestas?

Para mim, estes “grandes” que blasfemam os “pequenos”, “certos” que desaprovam os “errados”, sofrem da mesma inversão que combatem, cegos e extremos. Tão enobrecidos pelos ideais que levantam, esforçados em suas batalhas, enaltecidos por seus próprias consciências de que estão fazendo o maior e o melhor, a brava luta, trocam, novamente, como muitos os fizeram antes deles, o homem em si, pelo ideal do homem. A Justiça, ao invés dos homens justos, A Liberdade, ao invés dos homens livres, A Luta, ao invés de homens felizes.

Quero que alguém me diga como construir um novo mundo sem antes construir um novo homem. Mostrem como os homens cheios dos mesmos vícios e horrores podem cobrir-se do véu da “Guerra Santa”. Pois se assim não é, se minto, se são esses homens que jogam tijolos ferozmente, achando que vão erguer paredes, ao invés de entulho, os que vão mudar o mundo, porque todas as revoluções, lutas e revoltas caíram, por terem líderes que logo se corromperam, traíram todos os antigos ideais, trocaram a liberdade de todos pela sede de poder? E se uma ou outra revolução não se traiu totalmente, tão cercada está pelos ferozes que não pode abrir os braços e alcançar a todos.

No Brasil não é diferente. Os movimentos ditos revolucionários, de esquerda, socialistas, lutando pela justiça, cheios de nobres ideais, trocam a união e a fraternidade por disputas de poder, intrigas, saques e golpes. Os altivos leões tornam-se ratos trapaceiros, metidos no mesmo lamaçal de crueldade que combateram. Em grande, média ou pequena escala se repete este estado. Chefões ou militantes gritam furiosamente contra o partido opositor, repetem os hinos de controle. Justiça? Só se for a eleitoral.

O voluntariado, condenado, assiste aos escândalos que cercam seus algozes, e continua, fiel ao seu amor humano, a trabalhar estendendo a mão aos que sofrem da luta “do bem contra o mal”, valores que se confundem, quando a tentação humana pelo poder de ser maior entra em jogo.
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Não digo que todo voluntariado seja semeador de humanidade. Há mesmo muita verdade nas críticas que sofrem, pois alguns voluntários somente reproduzem os estados de pensamento da submissão, trabalham sem olhar para o amanhã, querem trabalhar sempre, ignorando que o objetivo é não terem mais que trabalhar desta forma, pois os males humanos se extinguiram. Inconscientemente fazem a manutenção do sistema de sangue.

Mas há outro voluntariado, o trabalho por livre e espontânea vontade, voltado pela reverter tais padrões, abrir os olhos, levar consciência, ajudar a andar, sem carregar, pois não se pode levar nos ombros todas as dores do mundo, mas podemos ajudar a fazê-las transformarem-se em ventos de mudança, força que humaniza. O trabalho voluntário é a expressão da solidariedade, a ação daqueles que sentem-se no lugar de seus irmãos que sofrem, querem sofrer com eles, para só assim, poder também gritar suas dores, querem pôr-se ao lado deles, para só então, caminhar lado a lado. Diferente dos “grandes”, que do alto de seus palanques acham que fazem revoluções, esbravejando acima das multidões, as massas, como eles chamam, inferiorizando a individualidade de cada um.

A luta política, no conceito que temos hoje, como unicamente através de partidos políticos, politicagem, busca por poder, avessa à solidariedade, é a maior hipocrisia do lado dos que tomam a bandeira do “bem”. Ser indivíduo expressivo, que compartilha, expande, abraça, já é ser sujeito político. Ser exemplo para todos poderem também se exprimir é ser sujeito político. Abraçar o desamparado é ser sujeito político, pois enquanto as eleições estão longe, o abraço alcança a alma.
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Como salvar o mundo sem antes salvar um homem?