terça-feira, 25 de março de 2008
Separados pelo abismo...
Naqueles tempos marcados pelo progresso e pelo regresso, luz e escuridão, força e fraqueza, todos os homens viviam n´uma montanha íngreme, muito alta, cujo pico, repleto de torres e edifícios vistosos, era muito apertado, pequeno, mas a medida que se descia pela encosta, ela se alargava mais e mais, cheia de buracos, cavernas, saliências e deformidades faveladas. A produção de todo o necessário a esses homens era feita na parte média da montanha, cujas inúmeras fábricas eram abastecidas pelos braços do gentio do Sul (como eles chamavam a base da Montanha) e pelos recursos naturais da abundante base rochosa e bruta, tudo rigorosamente supervisionado pelos frutos das Fortalezas Acadêmicas do Norte (assim conhecido, o topo), de onde saiam doutores de tudo.
A plebe e sua cultura (considerada) rústica (segundo os doutores de tudo) contava em suas histórias folclóricas da existência de duas Cidades onde se dividiam os homens. Os homens do progresso e os do regresso, em lados diferentes, bastante desiguais em altura, separados por um grande abismo por sobre o qual havia apenas uma única ponte, que só o progresso foi capaz de construir, e portanto, a esses homens cabia o controle. Pela estreita ponte se dava o contato entre as duas Cidades, uma relação bastante injusta, diziam muitos. Os nebulosos, como se autodenominavam os moradores das Torres das Nuvens, devido às alturas celestes, zombavam dessas “crendices populares”, comentando em suas rodas as graças da simplória história, seus absurdos e fantasias. Diziam quão tolo era essa idéia de apenas uma ponte controlada por um único lado, riam dos contrastes, segundo eles, aviltantes, que havia entre os homens da história. Tal contraste quebra a estética artística de uma obra, da literatura, observavam.
Mas entre as famílias dos homens do Sul, as crianças dormiam ouvindo as histórias passadas entre as duas Cidades. Elas brincavam inventando aventuras entre as Cidades, transformavam um beco imundo perto de casa ‘na ponte’ e lá viviam suas estórias.
Nesta montanha, onde os poucos nebulosos apertavam-se em suas torres distantes, desfrutavam dos prazeres abundantes produzidos nas fábricas incontáveis, invejavam-se e brigavam uns com os outros, por acharem sua soberba insuficiente, despejando as sobras e os dejetos rochedo abaixo, e onde o restante dos homens carregavam com seus cansados braços o peso de todas as pedras de seus trabalhos, obrigações, faltas e escassez, sujeira e tristeza, havia uma desolação que a muitos matava, pois os que trabalhavam não suportavam tanto, e os outros, não suportavam o próprio vazio.
Diz-se que certo dia, quando os nebulosos ordenaram aumentar a exploração das vísceras da montanha, para produzirem e consumirem mais, mandaram com punhos de ferro que mais ferro fosse tirado das minas para fabricação de latas onde todos os prazeres se guardavam, a Montanha rugiu sua impaciência com aquelas criaturas que a perfuravam impiedosamente e cuspiu fogo para todos os lados, Norte, Sul, acima, abaixo, matando primeiro os de baixo, que sofreram logo o calor das chamas, depois os de cima, que perderam suas fontes de mercadorias e luxos.
Antes da tragédia que apagou aqueles seres da face da rocha, algumas crianças já espalhavam que um velho sábio das ruas, barbudo e contador de histórias, disse que o abismo que separava as duas Cidades gritaria o fogo da exploração e derrubaria a cruenta ponte, para depois lançar ondas silenciadoras de vida sobre ambos os lados, antes a cidade do regresso, imensa aglomeração, porém situada na menor altitude, para em seguida engolir o progresso, perdido nas alturas.
Naquela desigualdade dita natural por todos, afinal, o abismo, esta "força da natureza", separava encostas distintas, a morte não fez diferenças e a todos levou. Se tivessem entendido melhor esse absurdo de abismo, será que poderiam ter-lhe contido as chamas e preservado a vida?
sábado, 22 de março de 2008
"Que tua vida seja tua fala. Viver a verdade é o caminho mais eficaz." Mahatma Gandhi
Amar - é humano
O Poder corrompe - frase corriqueira para explicar os desmandos da (ir)realidade moderna, justificando que os males deliberadamente provocados pelos homens são fruto desta corrupção imposta pelo fruto proibido do Poder. O Poder - o que significa isso? Que veneno atroz seria esse que à todos seduz? Poder viver - seria tão ruim? Poder libertar? Não me parece de todo mal. Poder acolher? Soa-me bastante cativante. Poder amar...
"O problema não é o Poder, mas o conceito que temos de Poder"
Se temos por Poder a capacidade de angariar privilégios para nos tornarmos ilusoriamente superiores, pretensiosamente maiores que os demais, acreditando tolamente que se constitui uma grandeza o ato de diminuir os iguais, deveras este tipo de poder só pode ser fonte de mal. No entando, seria o único poder existente? O único conceito viável? Não seríamos nós, seres dotados da racionalidade, capazes de refazer conceitos mal feitos?
Nossa forma de agir e reagir perante o mundo se constrói a partir dos conceitos que importamos do ambiente externo e dos que fabricamos em nós mesmos, analisando cuidadosamente as circunstâncias. Imperfeitos e imaturos que somos, somos constantemente comprometidos pelo erro, o que nos impele à necessidade de renovação. Reavaliar conceitos ruins é um hábito que acaba passando despercebido pela maioria, os quais, levados pelo cotidiano de comodismo, preferem persistir em seus padrões distorcidos à aprimorarem-se.
Conceitos... entendimento lógico que temos das coisas, ações, estados e realidades.
As vantagens que uns tomam sobre os outros surgem das brechas, das fraturas nos conceitos e valores que se encontram pelos oportunistas nos seus contemporâneos. E este conceito distorcido de Poder é uma das maiores brechas morais, rachaduras do ser humano. Mas como reavaliá-lo? Como poderia ser revisto? Que outro prisma haveria guardado dentro desta podridão que se tornou a idéia de poder, esta Caixa de Pandora que à todos leva a perdição, à ambição desmedida causadora de incontáveis males?
Já diz o ditado popular, embrutecendo o conceito pessimista de Poder:
“Queres conhecer um homem, dê Poder a ele”
Indicando nas entrelinhas que todos guardam grande maldade aflorada pelo Poder. Que razão, então, teve o Criador em fazer de sua criação uma fonte mascarada de maldade? Que sentido poderia ter tal insanidade? Seria uma brincadeira de péssimo gosto do Divino? Não posso crer que este seja o significado e o fim de todos nós – uma maldade intrínseca.
Sim, a liberdade que nos foi concedida é tão grandiosa que até mesmo para sermos maus fomos liberados. Pode-se crer que temos esse potencial sem prejudicar a lógica da criação, mas supor que esta seja nossa única e verdadeira essência ofusca a perfeição da criação, da vida, da natureza, da evolução espiritual a qual estamos seguindo.
Evolução. Revisão. Transformação. Reavaliar nossos conceitos, aprimorando a nós mesmos. O Poder, sendo visto como instrumento de nosso egoísmo, amplificado pelos conceitos individualistas, hedonistas e consumistas, característicos do Sistema Capitalista, certamente que é majoritariamente fonte de maldade, de crueldade, de injustiça e mal. Porém outros prismas para nossa visão são possíveis, outras formas de ver o mundo, expandindo nosso horizonte na medida que somos inteiramente livres para sermos o que somos, independentes de imposições sociais, como a visão capitalista do mundo.
Imaginemos um foco de luz, um círculo de claridade que abra uma janela em meio à escuridão deste Poder que corrompe. Sob um olhar humano, justo, fraterno, pacífico e amoroso, como poderia ser entendido o Poder? O Poder que cada um tem de trazer a paz ao outro, o Poder de irradiar felicidade, o Poder de restaurar a justiça, o Poder de impedir a violência, o Poder de transmitir a sabedoria, o Poder de Amar. O Poder de ser Vida, ser Luz, ser Paz e Amor. O Poder de Ser, contrapondo a ilógica imposição do Sistema do Poder de Ter.
Poder Amar, Poder de Amar, Poder de Amar-se, Poder de Amarmos-nos. O Poder de realmente sermos esta verdade que nos acolhe a alma, que nos faz transpor barreiras rumo à evolução. É tudo uma questão de escolha. Como você quer ver o mundo? Quem você quer ser? Que Poder queres pra ti? Tudo que quiseres, te será entregue, e é tua responsabilidade fazer o que quiser disto, mas o bem e o mal também são tua responsabilidade – tua, minha, nossa. Qual a sua escolha? Reveja seus conceitos.
“Que a tua vida seja tua fala. Viver a verdade é o caminho mais eficaz” Mahatma Gandhi
quarta-feira, 19 de março de 2008
A grande irmandade, esta humanidade...
sábado, 15 de março de 2008
Esvai-se a Vida pelas vitrines... Esgota-se o ar em frente aos televisores... Desfalece em último suspiro desejando ter mais...
quarta-feira, 12 de março de 2008
A união faz a flor... Braços dados, ouvindo e sentindo um ao outro, encontramos a nós mesmos, nossas verdades, nossa evolução... luz.
Se és sincero
e buscas a verdade
e tentas encontrá-la como podes,
ganharei
tendo a honestidade
e a modéstia
de completar com o teu
meu pensamento,
de corrigir enganos,
de aprofundar a visão...
Dom Hélder Câmara
--//--
Não temamos posições diversas, outros pensamentos, novas idéias, diferentes possibilidades. Tudo quanto existe, ai está para nossa riqueza espiritual, nossa evolução, nosso crescimento enquanto seres de potencial e luz.
Ousemos construir pontes dos mais variados materiais, ligando corações que possam compartilhar seus aprendizados e ensinamentos. A diversidade torna cada um infinito, e todos expressões da grandeza da criação, da beleza da vida, da força da luz.
Não temais o teu próximo, ame-o, abrace-o, sinta-o em corpo e alma.
Para aprofundarmos nossa visão, entendimento e espírito.
O Deserto é fértil! A Vida é fonte de luz...
“O essencial a transmitir é a descoberta maravilhosa: em todos os recantos da Terra, dentro de todas as raças, todas as línguas, todas as religiões, há criaturas que nasceram para dedicar-se, para gastar-se ao serviço do próximo, dispostas a não medir sacrifícios para a ajudar de verdade e enfim a construir um mundo mais justo e mais humano.
São criaturas ligadas ao meio em que se acham inseridas, mas que se sentem membros da Família Humana, a ponto de encararem como irmãos e irmãs, homens e mulheres de todas as latitudes e longitudes, de todos os climas e de todos os tamanhos, de todas as cores, de todos os graus de riqueza e de miséria, de todas as diferentes manifestações de cultura...
(...)
Deus teria inúmeras maneiras de distribuir seus dons. Se fosse um tímido, se se prendesse a julgamentos precipitados e sem base, repartiria seus dons em doses rigorosamente iguais para todos. Ninguém se poderia queixar: ninguém teria nada a mais, nada a menos. Tudo numerado, etiquetado, registrado...
Seria indigno da imaginação criadora do Pai. Seria de incrível monotonia, como se todas as criaturas humanas tivessem a mesma forma, a mesma cor, o mesmo perfume.
Deus aceita o risco de parecer injusto. Ninguém deixa de receber, pelo menos, o indispensável. Mas há quem receba com largueza estonteante. No caso, aludimos às verdadeiras riquezas: às riquezas interiores. E há os ricos de dons divinos, os privilegiados da graça.
Deus parece injusto, mas não é. Pede mais de quem recebe mais. Quem recebe mais, recebe em função dos outros. Não é maior, nem melhor, é mais responsável. Deve servir mais. Viver para servir.
O que importa não é pesar, medir, contar os dons recebidos. Não é ter recebido muito ou pouco. Importante é a firme decisão interior de responder ao máximo, e de servir.”
Dom Hélder Câmara – O Deserto é Fértil
--//--
Quantas vezes os que lutam não se sentem indignados e desanimados pela solidão da batalha pela justiça, frente à imensidão das injustiças? Quantas vezes sua esperança e coragem não fraquejaram perante o aparente isolamento de tão poucos grupos ou indivíduos na marcha por uma Humanidade de Amor? Sempre esperam que se juntem à luta todos os homens, todas as almas, todos os braços unidos para a construção deste mundo de paz e justiça amorosa, mas, será que todos estão destinados à lutar?
Alguns, naturalmente corajosos e questionadores, lançam-se no desconhecido da batalha, outros, tímidos e cautelosos, prefere assistir a realidade acontecer, mero expectador. Coragem se ensina? Impetuosidade se ensina? Podemos mostrar àqueles que nunca sentiram dentro de si a chama da luta, como acendê-la?
Talvez sim, talvez não. Uma coisa é certa, não podemos forçar um homem a lutar. Ele não poderá andar neste novo mundo de amor, se não acreditar nisso. O que se pode fazer é mostrar o caminho, e quem quiser, seguirá, ou não. O que podemos é incendiarmos nossos corações de indignação e ímpeto transformador, lutador, fraterno, e deixar que o vento leve essa centelha a outros corações. Podemos ser fonte, mas não podemos nem devemos ser imposições. Impor seria trair nossa própria causa de sermos fraternos, livres e justos.
Alguns nascem para lutar pela vida existente por sua preservação, outros para repor a perdida. Para que nasceste? O que sentes inflamar dentro de si?
Mas também existe a constante força contrária a qualquer transformação, mudança, questionamento, distribuição igualitária da vida. Esta força tem todo o interesse e intenção de apagar, coagir, coibir e oprimir as chamas da renovação, da mudança, da revolução, e nisso, os corações são educados para a acomodação, e algumas das chamas se rendem às cinzas. Essas chamas, sim, precisam ser atraídas para a verdadeira razão de ser e de viver, e as pessoas destinadas à manutenção da existência, à reprodução, também podem e devem estar juntos aos lutadores na consciência de justiça, paz e amor, para estarem sendo força de manutenção desta realidade ‘nova’.
“O Deserto é fértil”. Se a luta parece infrutífera, se nossas ações e sacrifícios não nos permitem ver os infinitos resultados, não havemos de desistir. Pois este deserto de caos, sangue e injustiças em que nos encontramos, onde o amor só com grandes dificuldades floresce em meio à aridez do egoísmo e individualismo geral, é justamente a nossa matéria-prima, a realidade que devemos transformar, que se fertiliza com o sangue de nosso sacrifício, com o suor de nossa caminhada, com a luz de nossas vidas, nossos espíritos.
“Importante é a firme decisão interior de responder ao máximo, e de servir.”
Sejamos o que somos, luz, vida, amor. Sejamos seres humanos, humanos.
terça-feira, 11 de março de 2008
"Do rio que tudo arrasta se diz que é violento. Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem!" Bertolt Brecht
Lei do silêncio, lei do mais fraco:
Ou aceita ser um saco de pancada ou vai pro saco"
(Até Quando? - Gabriel Pensador)
Polícia - instrumento de protenção da propriedade privada...
Entre a mulher e o capital... mulher, corra, que tu vale menos...
Entre o homem e o capital... homem, corra, que tu vale menos...
Entre a criança e o capital... criança, se esconda, que tu vale menos...
Entre o mundo e o capital... mundo, desista, acabou-se... virou banco do capital.
Capital
O capital,
A prioridade -
Para que cresça, cifras gordas
Defenda a propriedade
Que se exploda
A pobreza; se prolifere
A fome, a morte; o que querem
É do sangue lucrar bastante
Pra que esperar? Agora, neste instante!
As barrigas magras que caiam
Nas ruelas da miséria,
Os patrões nos terraços ensaiam
Os passos da próxima guerra!
Nas periferias da cidade
Fica o esgoto, o refugo...
Para o gritos dos excluídos
Está o mundo surdo!
Pra manter lucratividade
A polícia, afinal,
Precisa proteger o mal,
Manter a segurança do rico,
E que se aplique, se preciso
A pena capital!
Agora? Aja! Salve a humanidade, e estará salvando você...
Nos braços das folhas vivas
O sangue da natureza
Reflete as des´formas, as esquinas
N´uma gota de vida, de pureza...
Guardada esta fonte luz
Seja a última, sejam oceanos
Poderemos crer que nos conduz
A vida para o futuro dos anjos...
Mas não! Não, infelizmente
Os canos e tubulações
De nossas demências
Vícios, sujeiras, soberba deprimente
Destroem a vida, os corações
A natureza, nossa essência.
Salvar depois?
Sempre depois...
A enxurrada terá passado
E será tudo passado.
--//--
Abra os olhos para o mundo de feiuras
Respire este ar irrespirável
Prove o gosto amargo dos dejetos
Sinta o calor e o frio do que se perdeu
Ouça o grito dos que não se salvarão...
Agora? Aja!
...
"Quem sabe faz a hora, não espera acontecer!"
quinta-feira, 6 de março de 2008
Um hino para todos nós... "Quem sabe faz a hora, não espera acontecer!"
Geraldo Vandré
quarta-feira, 5 de março de 2008
"Não existe um caminho para a Paz, a Paz é o único caminho" - Mahatma Gandhi
Navegar é Preciso
Navegadores antigos tinham uma frase gloriosa:
"Navegar é preciso; viver não é preciso".
Quero para mim o espírito [d]esta frase,
transformada a forma para a casar como eu sou:
Viver não é necessário; o que é necessário é criar.
Não conto gozar a minha vida; nem em gozá-la penso.
Só quero torná-la grande,
ainda que para isso tenha de ser o meu corpo
e a (minha alma) a lenha desse fogo.
Só quero torná-la de toda a humanidade;
ainda que para isso tenha de a perder como minha.
Cada vez mais assim penso.
Cada vez mais ponho da essência anímica do meu sangue
o propósito impessoal de engrandecer a pátria e contribuir
para a evolução da humanidade.
É a forma que em mim tomou o misticismo da nossa Raça
Fernando Pessoa
--//--
De toda a humanidade, é minha vida
Muito mais que minha, é força motriz
De algo maior, fogo do universo, da revolta aguerrida
Na divina coragem da entrega me faço feliz.
Motivo de um peito que chora as dores
De outros peitos, corpos, irmãos...
Rumo ao combate da probreza, os Senhores
Façamos do amor, justiça e paz, nossa luta e canção!
O sangue que corre nas ruas reflete-se nos espelhos celestes...
(...)
Comi o meu pão em meio às batalhas.
Bertolt Brecht
Ó Céu, não vês quão injusta é esta terra?
Por que há homens que comem e outros não?
Céu, conte-me por que alguns subiram à ti,
Em suaves aviões, e como tu, são tão indiferentes
Perante àqueles que nunca te alcançarão.
Conte-me, pois há muitos erros nestas pradarias
Que estão distantes demais de tua infinitude azul;
E parece que não vês.
Vejo com meus dois olhos distantes um do outro
Quão distantes estão as realidades;
Com um, vejo barrigas estufadas e fartas de comer,
Co’outro, vislumbro a chorosa visão d’algumas
Tão contraídas, que são umbigos deformados.
Ah, Céu, sob teu surpreendente azul,
Há um mar tão vermelho, vermelho sangue,
De sangue de gente, de homens e mulheres;
Também há mares de vermelhos outros,
De carros rubros, vinhos e sedas carmesim;
E porque há estes contrastes tão vazios e tristes?
Porque ninguém se incomoda com o sangue?
Ah, Céu, acho que tua divindade nos contaminou,
E como tu, nos tornamos uma imensa humanidade -
Vazia – Imensa massa humana, animais urbanos,
Ricos de verdes notas, pobre de folhas verdes;
Como tu, somos grandes demais para nos preocupar
Com a terra. Ela não importa, quando há firmamento
Ainda por contemplar e viajar.
Ah, infame Céu, largaste-nos neste abismo
Territórios destruídos, buracos de explosão,
Ruína humana, restos de escombros e pernas,
E braços e corpos mutilados.
De ti, ó Céu, os mesmos aviões que não nos vêem,
Lançaram a morte sobre nós, e os povos da terra
Choraram perante o grande cogumelo branco,
O calor dos projéteis, a raiva do urânio.
Ah, Céu, enquanto tu chovia, talvez chorava
Lágrimas falsas, tentativa de esconder as chamas,
Um raquítico menino também chorava,
Porque eu estava comendo tanta comida
E ele nunca tinha visto tanto.
É, distante Céu, rarefeito anil de distâncias,
Estamos sós neste mundo de homens,
Muitos e solitários,
Fartos e famintos,
Entediados e desgraçados.
Não quero mais voar, enquanto aquela outra
Criança não anda por falta de forças,
E não quero mais tua beleza,
Porque uns belos olhos negros foram
Incinerados.
Ah, Céu, há também teu amor,
Amor quente do sol, amor calmo da lua,
Cujas barrigas minguadas e rostos abaixados
Nunca viram.
Este amor não é para os demais,
Apenas aqueles que, já tendo tudo,
Podem então começar a amar.
Minha boca está agora seca,
Foi a água de meu corpo embora
Em lágrimas
Destes meus olhos tristes que pararam
De olhar pra ti, e olharam para o mundo.
Ah, Céu. Anoiteça e não mais apareça,
Enegreça-te e te tornes preto como as peles
Queimadas pelo evolutivo fogo;
Negro como as cinzas dos derrotados;
Sombrio como a pólvora nas carnes.
Adentre em nossas almas, ó Céu,
E não veja nada, onde não há vida.
A vida foi embora no último automóvel
Vermelho que saiu da fábrica de pobreza,
Foi embora naquele navio gigante
Em mar de pedintes,
Foi embora, quando um homem virou menos
Que um homem, perante outro.
Céu, noturno, humano,
Céu, Diurno, tirano.
O Povo e o Dono - Dono?... Criou-se tudo e a todos pertenciam... Cada qual com seu direito, cada dever, o necessário!
3
Democracia da Ovelha, Justiça da Cerca, Progresso do chicote - Libertemo-nos!
Todos os graciosos cidadãos deste cercado agarram-se às falsas promessas, confiantes (tolos) no fim de seus tormentos. Crêem os pobres na revolução? Quando muito, nacos de pão. Pensam que as tosas se darão a intervalos justos (oquêi). Ou que o abate não se fará senão sob determinado intento (pois bem).
Mas as eleições são feitas, tempos em tempos, pelo dono das cercanias de modo a dizer-lhes que, por terem escolhido mal seu algoz, suportem o funcionário incapaz até o término de seu contrato, e que se rejubilem com seu destino, pois assim são as coisas e ninguém há de mudá-las.
É sabido, porém, que as boas ovelhas, envergonhadas de sua infeliz escolha, não levantam a voz nem a face para opor-se ao cajado que as conduz. Todas acreditam, de coração, que, aonde o pastor decidir conduzi-las, ali estarão em paz, afastadas do terrível lobo que espreita por cada fresta, e, dizem algumas, não tarda a se infiltrar no grupo para satisfazer-se sem sobressaltos.
Todos sabem que as ovelhas são animais estúpidos e não saberiam identificar um assassino entre as amigas. Para isso existe o pastor, que é de melhor estirpe e pode facilmente cuidar para que as coitadas, andando por aí por suas próprias idéias, não se percam em mato aberto, acostumadas que estão a arames farpados, vida regrada, fim definido (vitrine e panela).
Não somente as ovelhas escolhem seus pastores como também os burros interrompem a jornada para eleger a nova mão que os chicoteia. É sabido que os burros são bichos esforçados, embora às vezes empaquem e para isso é dado por Deus o direito da mão eleita descer sobre eles sua ferina chibata.
Uma ração mais farta de feno é o que prometem os candidatos. Contudo, de nada vale o cumprimento de tal promessa ao mais sábio dos animais, pois que as surras e a labuta tomam-lhe o porte e o dom de mastigar, e está definhando a olhos vistos. Contudo, conta com a regalia da desobrigação do voto, posto sua idade avançada, do que seu alto nível de conscientização não lhe permite dispor.
Não se trata aqui de alternativas reais para os que se vão conduzir ao laço, mas da simbólica atitude de aceitação para com seu destino. Legitimidade, todos sabem, é a alma do negócio. Dela carece mesmo o mais vil dos cretinos... Que dirá todo um complexo sistema que visa culpar os explorados por sua própria exploração?
À mim, ó ilusão juvenil!, nem a mão nem o algoz nem o pastor me domem, ou me impeçam de ir pastar onde quiser.
Não se enganem.
Sigamos cada um de nós nossos próprios caminhos.
Quem se deixa guiar, deixa que escolham por eles suas vidas.
Deixemos os 'pastores' para domarem o caminho das nuvens,
Assim como nos enganaram,
Que eles se enganem
Achando que podem domar a suprema liberdade
Dos ventos, das nuvens e dos homens e mulheres!
Solidariedade, Amor, Fraternidade - A maior liberdade!
Motivação hoje em dia é tema de tantas palestras e livros, palcos e editoras afora. Muitas pessoas vivem suas vidas na constante desanimação da rotina a qual elas acreditam serem forçadas, delegam seus caminhos à obrigatoriedade da sobrevivência, dos horários e prazos, da mecanicidade moderna, ignoram qualquer motivo maior, interior, próprio, para desempenharem suas funções, e diversas vezes desconhecem o que existe nelas além da ‘função’ que lhes foi atribuída. São engrenagens vivas que não lubrificam sua força motriz, suas almas, e acabam desestimuladas em seus trabalhos burocráticos, às vezes repetitivos. Acomodam-se.
Depois dessas ligeiras reflexões, gostaria de tratar d´outra questão, a solidariedade. Porque esse sentimento, valor, princípio, seja o que for, não é lá o mais comum entre as pessoas. O que em boa parte se explica pela simples razão de que a solidariedade não cabe neste mundo de obediência, repetição, indiferença e entorpecimento. Onde caberá o amor ao próximo n´um coração preocupado com ocupar com algum ‘nada’ um restante de tempo que deixou sobrar a obrigação, tratar o vazio interior com algum remédio que nos permita esquecê-lo, ignorá-lo?
Que ‘bela’ cultura esta moderna, uma cultura que celebra o ‘nada de novo’, porém disfarçado, maquiado pela erupção de ‘novidades mercadológicas’, escondendo a conservação do poder em mãos viciadas, pois este ‘nada’ não causa problemas, não questiona nem anseia por mudar as estruturas da injusta realidade.
Um ciclo que precisamos quebrar. Um ciclo que se quebra por si mesmo, pois torna tão insuportáveis e infelizes a vida de tantas almas andantes...
Mudemos. Sejamos amor próprio transbordando em infinito amor ao próximo.
“Amar é tudo o que importa!”
- Irmãos e irmãs, uma humanidade de amor e luz.
Que lugar melhor do que aqui! Que tempo melhor do que agora!
Algum dia existe?
Pode-se encontrá-lo pelos cantos escuros,
Empoeirados e esquecidos
Do calendário?
O que significa,
Além de algo inalcançável,
Sinônimo de desistência,
Prematura morte da certeza,
Falsa esperança, máscara de fel...?
Algum dia se alcançará a iluminação,
Algum dia a humanidade aprenderá,
Algum dia as pessoas saberão amar.
Algum dia...
- N´um 4 de Julho, de 1989, na Praça da Paz Celestial, um homem lutou naquele momento, naquele lugar, mesmo sozinho, tomou para si a coragem da humanidade e enfrentou o gigante que é a luta pela justiça, pela paz, pela igualdade e pela liberdade. Pode parecer que não, mas na verdade ele venceu a grande batalha - mostrar a todos que podemos lutar, que podemos revolucionar.