sábado, 26 de outubro de 2013
perdido...
a praia. é sempre a praia o cenário, o lugar. o mar. é sempre ele que mostra, que ensina sendo. Na praia, então. caminhando. o céu está ficando azul clarinho de novo, mais uma vez. daqui a pouco a terra vai nascer de novo, essa parte da terra, que está com ele. a água não está fria. mas também não está quente. o vento sim está frio e não tem casaco que esquente. o jeito é se abraçar e se concentrar na vista, nos barulhos do vento, dos cabelos cobrindo o rosto, da espuma nos pés. o jeito é se abraçar e deixar a areia fazer carinho nos dedos, no calcanhar que deixa marcas que não durarão mais que horas. o jeito é se abraçar e esquecer das pegadas. fazer outras. andar. dá para se esquecer das pegadas? porra, pegadas que ficam na pele, no nervo, na vida... Ainda que elas não estejam mais lá, tenham se apagado, não esquecemos delas... como conviver com a não convivência? como conviver com a própria vida sem nada além de si mesmo? procura se preencher, se preenche tanto, sempre preenchendo um pouquinho mais, isso e aquilo, experiências realmente boas, verdadeiras. preenchendo. mas, aquela velha história, não somos autosuficientes. como sobreviver à deriva, esses espaços desérticos entre um continente e outro, essa semente flutuando no meio do nada de água, tanta água e nada... a semente não aguenta navegar a vida inteira. nenhum navio pode existir sem a costa, sem a praia, sem água doce, que dê para beber, que dê para beijar, que cuide do lábio, da boca, do interior inteiro, que alimente. um pouco de calmaria instigante, que motive, que acolha, como aquela luz do entardecer, realmente querida, realmente preocupada com a gente. que quer ouvir nossas histórias, que pergunta e escuta, de verdade. e que conta histórias, sem que se pergunte. aquela luz que muda de cor, do azul, enrubesce, de tanto beijo, arroxeia, quando respira, aprofunda azul.
Dois em um - Mais uma Vez - essa música
sábado, 15 de junho de 2013
desancorou...
Sentiu uma falta... uma necessidade de carinho... como quem mergulha lá no fundo e quer voltar para respirar (ainda que não precise)... como uma memória do corpo que se lembra bem de como é bom estar junto... Uma contradição dele, que ao mesmo tempo que tão só, tão sem, tão difícil de chegar ou de encontrar, ao mesmo tempo sempre por milagre encontrou, pôde compartilhar o afeto que transborda em nós e que não podemos guardar, que nos escapa... como a fruta madura que a árvore deixa cair do galho por não poder mais segurar, doa... Acontece que ela não estava ali, não queria estar ali... afastava-se e afastava-se, como a ilha desaparecendo no horizonte quando o navio alcança o alto mar... ela não quisera navegar... doía-lhe sentir o sabor do mar, da amplidão tão grande deste mar, no qual o moço se encontrava... por mais que ela entendesse, soubesse, que quando entramos na água, nos banhamos em todos os oceanos da terra e isso é tudo, isso é tanto, estamos livres, podemos nadar... ela agora prefere o seco, a terra aparentemente firme, aparentemente sólida, aparentemente estável... a água é imprevisível demais, fluída demais, líquida demais... E assim, eles se separaram, aos poucos, como o horizonte... hora podem se ver, mas uma hora não poderão mais... E essa distância de léguas de mar até a terra também doeu... nele. E ele quis voltar... tentar trazer... estendeu a mão, chamou, chamou - vem, vem comigo... simplesmente estar, sem nada mais, sem garantia... flutuar, sem medo de se afogar, pois somos a água... E não veio. Entendeu, ela não vem... não adianta esperar... não se pode esperar... a correnteza nos leva pelo caminho e o fundo do mar é profundo demais para tentar alcançar a âncora... nem mesmo havia âncora naquele navio... um navio feito para navegar, não para esperar... Aprendeu. Dois caminhos então, que não se cruzam mais, não agora... se é isso que quer, apenas aceitar o movimento e seguir com ele pode... aprendeu... a não se pesar, não se apertar... a não sentir falta... (muitas faltas ainda precisará sentir), mas, ao contrário, ser feliz por que tudo é, está sendo e segue sendo... aprendeu muito e segue aprendendo... e no mar agora vive, um mar tão grande e tão vivo que com tudo nos relacionamos... um mar que nunca para, sempre em ondas, que sobem, descem, que a todas as praias banha, molha, descobre... que em toda parte chove, evapora, troveja... um mar de encontros... de azul de céu e de profundeza abissal...
Unravel - Björk - para aprofundar...
terça-feira, 23 de março de 2010
Expl´ódio!
"Conhece-te a ti mesmo!" e ninguém poderá mandar em você!
terça-feira, 23 de fevereiro de 2010
Tao
As pessoas se voltam para a religião
Quando elas já não acreditam em si mesmas
Elas começam a depender da autoridade.
Lao-Tsé, Tao Te King
sexta-feira, 19 de junho de 2009
Você não tem o direito de não se importar com os que estão morrendo...
terça-feira, 16 de junho de 2009
Nunca diga - isso é natural - para que nada passe a ser imutável.
Nós vos pedimos com insistência:
Nunca digam - Isso é natural -
diante dos acontecimentos de cada dia.
Numa época em que reina a confusão,
em que escorre o sangue,
em que se ordena a desordem,
em que o arbítrio tem força de lei,
em que a humanidade se desumaniza....
Não digam nunca - Isso é natural! -
Para que nada passe a ser imutável.
Eu peço com insistência
Não diga nunca - Isso é natural -
Sob o familiar,
Descubra o insólito,
Sob o cotidiano, desvele o inexplicável.
Que tudo o que é considerado habitual
Provoque inquietação,
Na regra, descubra o abuso,
E sempre que o abuso for encontrado,
Encontre o remédio.
.
Mas eu continuo pedindo com insistência - Nunca diga que "sempre foi" e, principalmente, "sempre será". Porque só será enquanto quisermos, e se assim é, é porque ainda queremos.
.
Que não permitamos mais que em nosso querer se encontre a injustiça, a violência e a morte, o egoísmo, a ganância e a vaidade, a indiferença, a passividade, o silêncio.
"Ver um crime com calma, é cometê-lo"
José Martí
Mas ai já era tarde...
Mas não me importei com isso,
Eu não era negro.
Em seguida levaram alguns operários,
Mas não me importei com isso,
Eu também não era operário.
Depois prenderam os miseráveis,
Mas não me importei com isso,
Porque eu não sou miserável.
Depois agarraram uns desempregados,
Mas como tenho meu emprego,
Também não me importei.
Agora estão me levando.
Mas já é tarde.
Como eu não me importei com ninguém,
Ninguém se importa comigo.
Você está realmente satisfeito com nossa realidade? Você consegue passar por um miserável e se sentir satisfeito? Tua vida te satisfaz? Teus sonhos te satisfazem? Teus amores, tuas experiências têm algum sentido quando contrastadas com a violência, o sangue e a crueldade do mundo?...
Quando nos levarem, já será tarde.
terça-feira, 9 de junho de 2009
Acordando
segunda-feira, 25 de maio de 2009
É o amor...
Canção
Sob o fardo
.....da solidão,
sob o fardo
.....da insatisfação.
.....o peso
o peso que carregamos
.....é o amor.
Quem poderia negá-lo?
.....Em sonhos
nos toca
.....o corpo,
em pensamentos
.....constrói
um milagre,
.....na imaginação
aflige-se
.....até tornar-se
huamano -
sai para fora do coração
.....ardendo de pureza -
pois o fardo da vida
.....é o amor,
mas nós carregamos o peso
.....cansados
e assim temos que descansar
nos braços do amor
.....finalmente
temos que descansar nos braços
.....do amor.
Nenhum descanso
.....sem amor,
nenhum sono
.....sem sonhos
de amor -
.....quer seteja louco ou frio,
obcecado por anjos
.....ou por máquinas,
o último desejo
.....é o amor
- não pode ser amargo
.....não pode ser negado
não pode ser contido
.....quando negado:
o peso é demasiado.
- deve dar-se
sem nada de volta
.....assim como o pensamento
é dado
.....na solidão
em toda a excelência
.....do seu excesso.
Os corpos quentes
.....brilham juntos
na escuridão,
.....a mão se move
para o centro
.....da carne,
a pele treme
.....na felicidade
e a alma sobe
.....feliz até o olho -
sim, sim
.....é isso que
eu queria,
.....eu sempre quis,
eu sempre quis
.....voltar
ao corpo
.....em que nasci.
Montanhas russas reunidas em círculos...
Profecias...
Montanhas russas reunidas em círculos
Montanhas russas reunidas em círculos
Rodopiando em discussões extensas
Um cotidiano nada rotineiro
Aprisiona e liberta em horários e exaustões...
E o estar presente quase incomoda
O sentimento de dever borbulha nos ouvidos
As ações são impulsionadas por princípios
Que não cansam nem esmorecem
Ainda que o corpo deseje a inércia...
Claro, óbvio e inegável é
Que tal desejo absurdo
É meramente provisório, tempos de açúcar
Quando os encontros sobrepõem-se aos pensamentos
E as tempestades nos pegam sem varandas ou tetos.
Suspiro, retomando o ar deixado na última sala,
O fôlego ansioso por um balanço tranquilo.
Acontece que lá fora não parece haver trégua
Pois são máquinas as forças contrárias e malévolas...
Não suam, não dormem e não se intimidam
Ante o infinito amor que temos.
E esse amor, mesmo infinito,
Não sendo como eles, violento,
Não pode simplesmente detê-los,
precisa apaixoná-los...
Mas quem?
Que paixões? Rumo à que corações?
Quem pode dizer... quem pode ser...
São tantos, são invisíveis e constantes... são inimigos e futuros de esperança...
Porque se nossa força é o amor
E a força contrária o oposto (mas não totalmente, espero)
Não podemos ser como eles, pois perderemos...
Queremos (eu e quem mais?) que eles
Se apaixonem
E não que morram (só em momentos de ira).
Sim, sim, que enigma metálico enferrujado
Que incrustado de conchas em portos abandonados
Que eras trepadeiras em muros desmoronando...
Que irrespostas desconexas e sem nexo...
Acontece que por maior que seja a loucura do mundo
E a nossa, diante de tudo
Só não podemos parar.
Mas a natureza não diz que não podemos cansar.
Ao contrário, como cansa.
E nisso, do alto da montanha russa
Aquele frio estomacal tremula
E irrompe poros afora...
Suamos, frio.
Há calor também. Muito. É o próprio amor.
Uma total dicotomia paradoxal de estrelas que se chocam.
Sem uma lógica matemática exata e concisa...
Apenas a continuação interminável de utopias delirantes
Que perseguimos convictos da vitória da vida!
Numa militância que atravessa as madrugadas
Na ânsia milimétrica de invernos e primaveras
Tornados esfumaçados, tosses e desgastes
Visões em preto e branco de plástico
E odores bons e ruins...
Enfim.
É isso.
Então.
E ai?
O que resta é descansar na agitação
Agitar o cansaço
E seguir em frente, aberto para o abraço
Beijando todo o espaço
Tudo que há e é.
Carregando o amor não como um fardo
Nem a esperança como uma pedra entalada na garganta
Mas como asas, únicas formas de salvar-nos
Do abismo que se despedaça sob nossos pés
E nossas mãos
E nossas vidas
Para sermos verdadeiramente
E profundamente
De maneira completa
Plena
E apaixonada.
Explodiremos, é fato.
A explosão será indescritível, indiscriminada
Levará a todos.
Todos se perderão, mas já estavam perdidos.
Mas nos encontraremos, mais ainda
Todos serão finalmente apaixonados
Depois da explosão.
Depois que as paredes todas forem derrubadas
E as portas da alma arrombadas
Permitindo a união inimaginável
A Comunhão da Vida em uma só.
Fim. Início. Infinito. Círculo. Comum...(ismo).
Não será através da força
Mas do amor.
A revolta será espiritual
E as chamas arderão nas almas
Os gritos brotarão do espírito
E as mãos andarão dadas
Pés juntos, passos largos.
Desmoronarão de suas torres
Dos altos edifícios
Dos terraços rarefeitos
Das alturas da tolice
Do topo dos egoísmos
Do alto das ganâncias
Até o fundo do poço
De onde poderão ressurgir iguais
Horizontais
Humanos, reais
Sem autoridades
Sem banalidades
Sem formalidades
Sem burocracias
Sem hipertrofias
Sem infantarias
E sem ódio.
Quando o “mundo” cair,
Quem ainda houver
Terá a nova chance
De nascer.
Quando o “civilizado” ruir
Quem ainda houver
Terá a nova chance
De pensar.
Quando o “sistema” se destruir
Os que ainda houver
Terão a nova chance
De se unirem.
Quando o “muro” for derrubado
Os que ainda houver
Terão finalmente a chance
De se amarem.
quarta-feira, 25 de março de 2009
Dispensado por motivo de consciência!
Caio Maniero D’Auria é um enxadrista. Calculista. Paciente.
Insistente. Irritante, até. Graças a essas características, tornou-se,
aos 22 anos, o primeiro brasileiro dispensado do serviço militar
obrigatório por “razões políticas e filosóficas”. Na prática,
significa que ele foi dispensado sem nem precisar jurar à bandeira.
Para muitos, a formalidade é apenas um detalhe. Para ele, uma batalha
de quase cinco anos de duração em defesa da “liberdade”.
Todos os anos 1,6 milhão de jovens alistam-se e cerca de 100 mil são
incorporados ao Exército, à Marinha ou à Aeronáutica (em 2008 foram 80
mil), segundo o Ministério da Defesa. Desses, 95% declararam no
alistamento desejo de servir. Os que não queriam, foram convocados por
ter alguma habilidade necessária à unidade militar da região. “A
Estratégia Nacional de Defesa pretende alterar esse quadro, de modo a
que o serviço militar seja efetivamente obrigatório, e passe a
refletir o perfil social e geográfico da sociedade brasileira”,
anuncia o Ministério da Defesa, sem dar detalhes de como isso será
feito.
Por ora, a única exigência feita para os dispensados é uma pastosa
cerimônia de Juramento à Bandeira, tão esvaziada quanto a obrigação de
executar o Hino Nacional antes das partidas de futebol em São Paulo.
Ninguém reclama. Caio recusou-se.
Determinado a encontrar um meio válido de não jurar à bandeira,
entranhou-se nas leis militares. Telefonou para o Comando Militar do
Sudeste e soube que podia pedir para prestar um serviço alternativo e
que, por não haver convênio firmado, isso resultava na dispensa
automática. “Mas a secretária da Junta Militar me falou que só
Testemunhas de Jeová podiam alegar objeção de consciência. Ela me
mandou jurar à bandeira, mas eu estaria mentindo se jurasse dar a vida
pela nação, pois jamais faria isso”, diz, com um sorriso tímido de
quem mal deixou a adolescência.
De próprio punho, Caio redigiu uma “declaração de imperativo de
consciência”, e declarou-se anarquista. A Junta Militar exigiu a
declaração de uma associação anarquista confirmando o vínculo. Caio,
então, contatou mais de vinte organizações em busca de, como diz, uma
“carta de alforria”. Perdeu um ano nessa. “Os anarquistas brasileiros
não tiveram a coragem de colocar em prática o que tanto pregam. A
maioria está mais interessada em festinhas”, reclama. E pondera: “Acho
que eles tiveram medo de ser fichados pelo Exército”.
Desiludido, encontrou na internet a organização Movimento Humanista.
Enfim, sentiu que seria atendido. “Pregamos a não-violência e somos
contra o serviço militar obrigatório”, diz Paulo Genovese, coordenador
do grupo, que faz reuniões semanais e promove a Marcha Mundial pela
Paz e pela Não-Violência.
Diante de nova declaração de objeção de consciência, a Junta pediu
dados dos integrantes e o CNPJ da organização. Três meses depois, foi
preciso detalhar quais eram as incompatibilidades do movimento com o
serviço militar.
Era janeiro de 2008. “Passei noites em claro redigindo. Fui
pessoalmente entregar”, diz, satisfeito. Sustentou que os humanistas
colocam “o ser humano como valor central”, enquanto os militares devem
defender a pátria “mesmo com o sacrifício da própria vida”. E que o
“repúdio à violência” é incompatível com o “amor à profissão das armas”.
Quatro anos e oito meses após se alistar, Caio pegou seu Certificado
de Dispensa do Serviço Alternativo. Em 2008, apenas seis jovens foram
eximidos por objeção de consciência. Nos últimos cinco anos, 232. Mas
Caio foi pioneiro. “Nunca motivos políticos livraram alguém, o meu
processo é o número 001/08. Abri um precedente e agora tenho onde
lutar por minha liberdade e pela dos demais”, comemora ele, que é
analista de dados de telemarketing. Há anos quer prestar concurso
público. Agora pode.
quinta-feira, 5 de março de 2009
As 5 dificuldades em escrever a verdade - parte 1 - Bertolt Brecht
Bertold Brecht
As 5 dificuldades em escrever a verdade - parte 2 - Bertolt Brecht
2- A INTELIGÊNCIA DE RECONHECER A VERDADE
Como é difícil dizer a verdade, já que por toda a parte a sufocam, dizê-la ou não parece à maioria uma simples questão de honestidade. Muitas pessoas pensam que quem diz a verdade só precisa de coragem. Esquecem a segunda dificuldade, a que consiste
Em primeiro lugar, já não é fácil descobrir qual verdade merece ser dita. Hoje, por exemplo, as grandes nações civilizadas vão soçobrando uma após outra na pior das barbáries diante dos olhos pasmados do universo.
Acresce ainda o facto de todos sabermos que a guerra interna, dispondo dos meios mais horríveis, pode transformar-se dum momento para o outro numa guerra exterior que só deixará um montão de escombros no sitio onde outrora havia o nosso continente. Esta é uma verdade que não admite dúvidas, mas é claro que existem outras verdades.
Por exemplo: não é falso que as cadeiras sirvam para a gente se sentar e que a chuva caia de cima para baixo. Muitos poetas escrevem verdades deste gênero. Assemelham-se a pintores que esboçassem naturezas mortas a bordo dum navio em risco de naufragar. A primeira dificuldade de que falamos não existe para eles, e contudo têm a consciência tranquila. "Esgalham" o quadro num desprezo soberano pelos poderosos, mas também sem se deixarem impressionar pelos gritos das vítimas.
O absurdo do seu comportamento engendra neles um "profundo" pessimismo que se vende bem; os outros é que têm motivos para se sentirem pessimistas ao verem o modo como esses mestres se vendem. Já nem sequer é fácil reconhecer que as suas verdades dizem respeito ao destino das cadeiras e ao sentido da chuva: essas verdades soam normalmente de outra maneira, como se estivessem relacionadas com coisas essenciais, pois o trabalho do artista consiste justamente em dar um ar de importância aos temas de que trata.
Só olhando os quadros de muito perto é que podemos discernir a simplicidade do que dizem: "Uma cadeira é uma cadeira" e "Ninguém pode impedir a chuva de cair de cima para baixo". As pessoas não encontram ali a verdade que merece a pena ser dita. Alguns se consagram verdadeiramente às tarefas mais urgentes, sem medo aos poderosos ou á pobreza, e, no entanto não conseguem encontrar a verdade. Faltam-lhe conhecimentos. As velhas superstições não os largam, assim como os preconceitos ilustres que o passado frequentemente revestiu de uma forma bela. Acham o mundo complicado em demasia, não conhecem os dados nem distinguem as relações.
A honestidade não basta; são precisos conhecimentos que se podem adquirir e métodos que se podem aprender. Todos os que escrevem sobre as complicações desta época e sobre as transformações que nela ocorrem necessitam de conhecer a dialética materialista, a economia e a história. Estes conhecimentos podem adquirir-se nos livros e através da aprendizagem prática, por mínima que seja a vontade necessária. Muitas verdades podem ser encontradas com a ajuda de meios bastante simples, através de fragmentos de verdades ou dos dados que conduzem à sua descoberta.
Quando se quer procurar, é conveniente ter-se um método, mas também se pode encontrar sem método e até sem procura. Contudo, através dos diversos modos como o acaso se exprime, não se pode esperar a representação da verdade que permita aos homens saber como devem agir. As pessoas que só se empenham em anotar os fatos insignificantes são incapazes de tornar manejáveis as coisas deste mundo. O objetivo da verdade é uno e indivisível. As pessoas que apenas são capazes de dizer generalidades sobre a verdade não estão à altura dessa obrigação.
Se alguém está pronto a dizer a verdade e é capaz de a reconhecer, ainda tem de vencer três dificuldades.