Desenvolvimento Humano e Capitalismo(?)
É inerente ao homem e a mulher o desejo de melhorar, seja seu bem estar, sejam suas qualidades ou qualquer aspecto de sua vida, individual e coletiva. Se assim não fosse, a espécie humana não teria saído do patamar animal, nem adquirido a distinção e supremacia na teia da vida no planeta. Contudo, apesar desse ‘instinto’, muitos problemas podem acontecer no caminho, desviando-o deste objetivo. O simples fato de existirmos e agirmos no ambiente não significa estarmos melhorando, somente que temos tal potencial.
É inerente ao homem e a mulher o desejo de melhorar, seja seu bem estar, sejam suas qualidades ou qualquer aspecto de sua vida, individual e coletiva. Se assim não fosse, a espécie humana não teria saído do patamar animal, nem adquirido a distinção e supremacia na teia da vida no planeta. Contudo, apesar desse ‘instinto’, muitos problemas podem acontecer no caminho, desviando-o deste objetivo. O simples fato de existirmos e agirmos no ambiente não significa estarmos melhorando, somente que temos tal potencial.
A história da humanidade exploradora (e não é essa toda a história) e todas as suas injustiças, genocídios, roubos, explorações e guerras mostra que, contra toda natureza construtiva e positiva, o homem levantou uma sociedade baseada na morte e no sangue, onde dois terços da população mundial sucumbem na miséria para sustentar o padrão de vida do restante. Acontece que esta parcela beneficiada e responsável por esta sociedade desumana não permitiria jamais que viesse à tona a realidade na sua totalidade. Assim, criam-se várias formas de mascarar as abomináveis injustiças e empurrar a responsabilidade do sofrimento para os que sofrem - a miséria torna-se culpa dos miseráveis, as mortes, culpa dos assassinados, a injustiça, culpa dos injustiçados, a exploração, culpa dos explorados.
A classe dominante, seja nacionalmente ou mundialmente, faz dela mesma o modelo de desenvolvimento, a partir, certamente, de um conceito de ‘desenvolvimento’ bastante questionável, visto que tal condição de ‘prosperidade’ só foi possível através de um longo processo histórico de espoliação de incontáveis povos em colonizações sem fim. A dominação de povos criou uma hierarquização entre eles, estando à frente os senhores das armas e na base os servos operários.
No século XIX e XX, com o desenvolvimento das ciências sociais como as Ciências Políticas, a Sociologia, a Antropologia, a História, a Economia e tantas outras, começou a tentativa de ‘categorizar’ as nações. Quando os grupos humanos passaram a se sobrepor, veio a noção de dominantes e dominados, depois a idéia de reinos cristãos, acima, e pagãos, abaixo, após vieram as nações colonizadoras, ‘superiores’ e colonizadas, ‘inferiores’, com o tempo surgiu o conceito de Primeiro Mundo, “desenvolvido” e Terceiro Mundo, “subdesenvolvido”. Hoje se mascaram essas gritantes diferenças entre as nações e criam-se outras formas de hierarquizá-las, ignorando o processo histórico que as fez o que são.
Em 1990 o economista paquistanês Mahbub ul Haq criou o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), adotado pelo PNUD, que se une ao ranking dos PIBs (Produto Interno Bruto) para criar nova categorização dos países no cenário internacional, distinguindo os países através dos fatores econômicos e sociais. O IDH é baseado em três indicadores, educação, renda e longevidade, estes que são calculados de acordo com a média aritmética de analfabetização e matriculados no sistema de ensino (educação), renda per capta (renda) e expectativa de vida (longevidade). Tal forma de avaliação não permite visualizar a desigualdade social, posto que baseia-se na média quantitativa.
Na lógica da competição, cada país busca sempre aumentar seu PIB para mostrar aos outros a potência de suas economias, e seu IDH, para ‘provar’ que é um país adequado para a população.
Mas uma realidade muito diferente se esconde por trás destes índices. Primeiro que não importa para o PIB se ele é gerado através da exploração e da miséria de povo nacional e de outros países, não importa para o IDH se os cidadãos saibam realmente usar expressar-se e utilizar a comunicação na participação social, basta que saibam unir símbolos de acordo com determinadas regras para tornarem-se ‘alfabetizados’. Não importa se eles têm um ensino de qualidade que os proporcionará autonomia de pensamento e reflexão social para construir novos horizontes, basta que estejam matriculados em uma instituição cujos documentos ‘comprovem’ que ela é de cunho educacional. Não importa se a renda per capta esconda que pouquíssimos possuem a maior parte da riqueza enquanto inúmeros não têm quase nada, basta que a ‘média’ seja aceitável. Não importa se a expectativa de vida seja gerada através da simples cura das doenças, sem a devida preocupação da sociedade em evitá-las, ao contrário, com grande interesse em gerá-las, motivado por uma medicina industrial e megacorporativa que mais está preocupada em vender remédios do que salvar vidas. Não importa se os homens são postos em pedestais ou latrinas, importa que cresçam os lucros.
Coincidentemente o conceito de Desenvolvimento Humano (DH) também surgiu em 1990, criado pelo PNUD, de onde veio o Paradigma do Desenvolvimento Humano. “Segundo esse paradigma, o que uma pessoa se torna ao longo da vida depende de duas coisas: das oportunidades que teve e das escolhas que fez. Além do acesso às oportunidades, as pessoas precisam ser preparadas para fazer escolhas.” A idéia é bela, mas na medida em que o IDH, ferramenta utilizada para medir e entender o desenvolvimento humano, é feito de forma a mascarar os problemas sociais, sem propor mudanças estruturais na sociedade e no sistema sócio-econômico que realmente transformem a as condições de vida humanas, nada além de disfarces pode ser proporcionado.
Analisando com maior profundidade essa condicional – oportunidades e escolhas – podemos ver quão contraditório se torna quando não é levado em conta o sistema em que se encontra, o capitalismo. Como se podem oferecer oportunidades a todos, como propõe o conceito de DH em um sistema baseado na desigualdade social, quando o objetivo é concentrar capital na mão de poucos através da exploração da mais-valia? Na marginalidade de parcela significativa da população, quando torna-se necessário, para controle dos trabalhadores, a existência do desemprego para manter baixo os salários e forçar o trabalhador a gostar do próprio salário (que é uma parcela mínima da riqueza produzida por ele) para qualificar-se para manter-se em um emprego que a qualquer deslize o põe na rua? Na dominação, quando o poder político é irmão do poder econômico, ou seja, as oportunidades são geradas pelos que têm dinheiro e os que têm dinheiro são os mesmos que promovem a desigualdade, a marginalidade e a dominação?
Como se pode preparar alguém para fazer escolhas (e que escolhas?) quando se cria a ideologia nas mentes populares de que o importante é ganhar dinheiro através de um modelo assalariado que gera concentração da riqueza, de um modelo de crescimento infinito que não leva em conta a real sustentabilidade humano-ambiental e de um modelo de administração estatal, que monopoliza o poder, excluindo a classe trabalhadora (os geradores da riqueza, diga-se de passagem), e que é guiado pelos interesses econômicos da elite? Como?
Integrado ao Paradigma do DH, soma-se a idéia de uma nova pedagogia para complementar a iniciativa da ONU na promoção da “Paz, Direitos Humanos e Desenvolvimento” (‘objetivos’ da organização). “O Relatório da UNESCO (...) veio nos apontar o rumo da educação no século 21: Os Quatro Pilares da Educação para o Século 21, que se apresentam como o sólido alicerce para a construção de um ideal de homem para os novos tempos: aprender a ser, aprender a conviver, aprender a fazer e aprender a conhecer.” Dentro do sistema capitalista? O que acontece é que aprendemos “a ser” produtivos e consumistas, aprendemos “a conviver” com as desigualdades e injustiças, aprendemos “a fazer” o que nos mandam e “a conhecer” só o que garantirá um bom salário. Claro que nem todos são assim, mas a maioria é, pois o sistema é eficientíssimo no controle social e intelectual.
No início, meio e final das contas, a idéia que se cria de Desenvolvimento Humano, alicerçado pelo IDH, está em consonância com o sistema Capitalista e apenas esconde o fato de que sob tal sistema político-econômico a desigualdade, injustiças e violências serão perpetuadas, pois são fundamentais para ao mecanismo da máquina capitalista. Qualquer caminho que se queira tomar que realmente objetive acabar com tais mazelas sociais da humanidade, ao invés de meramente diminuí-las, primeiro tem que propor acabar com tal sistema e no lugar levantar uma humanidade baseada na solidariedade, na igualdade e verdadeira liberdade (de todos e não só de alguns poucos), onde não existam maiores nem menores, dominadores nem dominados, exploradores nem explorados. Que realidade será esta? Que ideologia a guiará? Muitas idéias existem, mas os detalhes e a verdade só poderão ser provados quando tivermos a impetuosidade e imperiosidade de fazê-lo todos juntos, com uma nova consciência humana.
Mas, para descobrir que nova ideologia é essa, apenas faça-se a pergunta – Qual combate a desigualdade na forma de autoridade e hierarquia, combate a dominação na forma de Estado e poder econômico, qual combate o individualismo suicida na forma de consumismo e indiferença? Pergunte-se.
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